4.5.07

o que me faz rir:

"Mas eu não consigo desencanar, pondera R. Já paguei três anos de psicoterapia e não desencanei. Já nasci encanado. Sou um narciso masô: vivo encanado em mim mesmo.
(..)
O problema espacial do studiô, considera R., enquanto enrola um piccolo finório pra arrematar a engazopação, é que ele não guarda a separação entre essência e aparência, própria da casa burguesa com certeza. (..) R., com sua melhor pose casual vai se trancar no banheiro, que fica literalmente a um passo da cama. Urge cagar. Já não consegue pensar em outra coisa que não sejam seus movimentos peristálticos. (..) Eis que uma salva de flatos longos e breves, grossos e finos, secos e molhados, se produz, perfeitamente audível -
E agora? Só o silêncio acusador do outro lado da porta. Ricardo aplica o olho à fechadura e enquadra Vera tentando sufocar gargalhadas selvagens com uma almofada. Pronto, conclui, sereno e fatalista como um Buda: agora a moça já sabe que eu tenho cu e intestinos. Mais relaxado, continua a cagar em paz."
[Reinaldo Moraes, 'tanto faz']